sábado, 17 de novembro de 2007

Um pedacito de mim!... de nós!!!

Angola continua na mesma!!...

Um pedacito de mim!... de nós!!!

Cheguei a Luanda dia 12 de Novembro pelas 6,30 da manhã, bem cedo portanto. O calor já começou por estes lados. No meu Portugal deixei também algum calor e o frio que está a começar a apertar. Nisso fiquei a ganhar, pois prefiro calor a frio, mas também o calor só o aguento aqui, com o ar condicionado sempre a funcionar.

Estou a cerca de 15 Km de Luanda, ou seja, a cerca de 15 minutos a andar de carro aí no nosso Portugal, porque aqui, demora-se no mínimo dos mínimos 1,30h, mas o mais normal é demorar 3 a 4 horas ou mais, dependendo do trânsito, da lama, dos buracos, dos carros avariados na estrada, do lixo, etc…

Estamos na época das chuvas, que costuma durar horas ou dias, só que é uma chuva que até sabe bem, porque o calor é muito. Os nativos daqui aproveitam para tomar banho quando chove, o pior é quando tomam mesmo banho nas poças de água barrenta. Um horror!!! Mas para eles, é uma festa!! Banho de praia!! Há que aproveitar.

Aqui é muito engraçado, tenho que aprender a não fazer nada!!! Escuso de me chatear! Temos empregadas que fazem as refeições, limpam as casas, tratam das roupas, etc… Custa um bocado agente habituar-se, mas depois vamo-nos ambientando. Vamos ver é se depois em Portugal ainda sei fazer as minhas coisas. Sim, porque lá não há empregadas ao preço da chuva, nem o dinheiro chega para tal. Queremos fazer qualquer coisa ou ir a algum lado??!! É escusado estar com pressa ou fazer planos de chegar às tantas, porque sai tudo furado. Aqui as coisas funcionam ao ritmo do” lento ao parado”, como já uma vez eu tinha dito.

Isto é realmente um desambientarmo-nos dos nossos (bons)hábitos!!

Vivi em Luanda, há muitos anos atrás, uma parte da minha infância e juventude. Foram só 8 anos, dos meus 9 aos 17 anos, mas para mim, foi como se tivesse vivido aqui uma eternidade, pois as recordações desse tempo e das coisas boas e bonitas que aqui vivi, permanecem até hoje na minha memória. Agora que aqui estou de novo e passados 30 e tal anos, vejo-me aflita para conseguir localizar certas coisas, outras vejo-as todas partidas, sujas e sei lá que mais e fico cheia de pena, porque Angola tem um não sei o quê, que fica gravada na nossa vida.

Por coincidência, após um reinício de vida em Portugal, com os meus pais, venho a conhecer e a casar com o Georgino, que tinha vivido em Luanda, precisamente na mesma altura que eu. Chegámos até a morar muito perto um do outro, mas o destino quis que apenas nos conhecessemos em Caldas da Rainha. Escusado será dizer que com Angola tão marcada na minha e nossa vida, sempre tive o desejo de um dia (??) poder vir a Angola mostrar os locais onde tinha andado aos meus filhos, a Vera e o Valter. O Georgino, como já cá tinha vindo depois da independência e tinha visto a degradação do País, tirou-me isso da ideia dizendo que nem pensasse nisso, porque isto não tinha condições, isto não dava para cá estar e era mesmo melhor eu nem vir cá ver como isto ficou!!! Porque já não estava nada do que nós tínhamos deixado!! Acabou assim o meu sonho de voltar a Angola e dá-la a conhecer aos meus filhos. Pensava eu!! Não é que a Vera um dia me chega a casa e diz:- Mãe vou dar um ano às missões. Conheci umas pessoas que estão a começar um projecto missionário e ofereci-me para ir neste primeiro ano de missão. Acho que eles estavam mesmo a procurar mais uma pessoa para ir, por isso se eles disserem que sim, eu vou. Mas para onde? – pergunto eu!!

É para Angola- diz ela. Para Angola???!!! -Nem penses, o pai diz que aquilo está muito mau, e ainda por cima não é para Luanda. Aquilo lá para baixo (Sumbe) andou cheia de guerras! Nem penses nisso!!...

Como eu não lhe dei muita saída, foi ter com o pai (Georgino) a contar o mesmo, e não é que ele apoiou a ideia??!! Ainda lhe disse:- Vai, que depois nós vamos lá visitar-te e posso ajudar-vos também na electrificação da casa (Ondjoyetu) que o grupo missionário a que a Vera se ligou queria construir no Sumbe!!...

Fiquei desatinada, claro está, embora a missão fosse algo nobre e de valor!!...

E foi assim que vim novamente parar a Angola, onde agora me encontro.

Vim o ano passado pela primeira vez, depois da minha juventude. Vim na semana antes do Natal, e fui passar o Natal ao Gungo com o grupo missionário de que a Vera ficou a fazer parte.

Adorei a experiência, agradeci ao grupo missionário a oportunidade que me deram de me levarem com eles. Todo o grupo foi simpático, e ficámos entretanto amigos, pelo menos das meninas, com quem eu passei mais tempo. A Catarina, a Sónia, a Vera e eu, temos uma vivência que nos ligará para sempre, porque fomos nós que ali vivemos e partilhámos emoções. Que canseira, que medo, que desatino (pela dificuldade em nos entendermos!), mas que engraçado que foi ao mesmo tempo!!...

Eu quis voltar a Angola, mas foi a Vera que acabou por nos trazer cá novamente.

Agora, quero e vou tentar que o Valter também cá venha conhecer esta terra. Vamos ver se me aguento por aqui até ele cá poder vir. E até lá, espero que o país melhore um pouco as suas condições. Um pouco, porque ao mesmo tempo quero que ele veja como isto é, para não pensar que eu falo mentira, ou aliás para ver melhor com os olhos dele, porque isto é como eu costumo dizer: Contar como é, é uma coisa, ver e sentir como é efectivamente, é outra e bem diferente!!!

Um pedacito de nós!!

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

A experiência do meu Natal 2006.... (Cont.)

Durante o tempo que passei na Donga, brinquei com a Sónia e a Catarina com os meninos. Ensinámos-lhes as nossas canções que eles cantaram a custo, por vergonha e não entenderem bem o Português. De todas, que eles mais gostavam de cantar era o "Abumbué"!
O contacto com as mamãs foi bem mais difícil porque não nos entendem e têm muita dificuldades em perceber-nos. O povo está muito arreigado ao seu dialecto - Umbundo - e como não têm frequentado escolas por causa da guerra, não percebem nem entendem bem o português. Agora as escolas já estão a começar a funcionar, por isso os mais novos e mesmo os jovens e mais velhos que queiram aprender já as vão frequentando. O material escolar é quase inexistente e apenas aparece nas cidades, por isso esta equipa missionária tem dispensado alguma atenção a este assunto e todas as semanas carregam muito material escolar (do que veio de Portugal de ofertas) para levar para o Gungo. Não o dão às pessoas como seria o nosso primeiro pensamento. Fazem o tipo de uma cantina e vendem tudo por um preço irrisório (que o dinheiro deles também não é muito!) mas é com o fim de os "ensinar" que as coisas não vêm ter com eles do nada, têm que trabalhar, vender o que produzem para ganhar dinheiro e comprarem o que lhes faz falta. É a lei da vida, que este povo tem que aprender, pois não está habituado assim! Também com a saúde, o procedimento é idêntico. Não há médicos nem enfermeiros, apenas na cidade, o que é muito longe. Então aqueles que têm mais capacidade para aprender, vão à cidade tirar um curso de saúde pública e são eles os "Promotores de Saúde" que dão um tipo de consultas às pessoas que estão doentes. As pessoas dizem o que têm ou o que lhes doi e eles aconselham os medicamentos a tomar, que são quase sempre os mesmos, pois dão para imensas coisas. Por exemplo, para as dores seja ela qual for, usam o Paracetamol!! Esses medicamentos também são arranjados pelas missionárias, que os levam para a Donga e os vendem por um preço irrisório e por comprimidos, não por caixas, como nós usamos. Fez-me uma confusão enorme este procedimento, e quando os via a irem comprar tantos comprimidos disto, tantos daquilo, e para o pagamento não tinham dinheiro que chegasse?! -ensei que por dois ou três comprimidos, lhos dessem. Eu faria logo isso, mas a cantina não funciona assim!! Têm que ter dinheiro para pagar os comprimidos ou então diminuem os que for preciso, para dar com o dinheiro que têm. Ainda fiz a observação: - Ó Vera, como é que vocês têm coragem, coitados, dá-lhes os comprimidos!! Mas fui logo advertida:-Não pode ser. Temos que os ensinar a controlar o seu dinheiro. O nosso intuito não é dar-lhes as coisas, disse-me a Vera, o nosso intuito é ensiná-los. Se lhes dermos hoje, vão querer também amanhã e no outro dia e depois já nem trabalham, porque sabem que nós lhes damos e não precisam de se esforçar!!.. Aí, entendi, que embora nos custe, realmente temos que perceber que o bom não é dar o peixe a esta gente, mas sim ensiná-los a pescar, para que quando os missionários voltem às suas terras eles saibam pescar sozinhos.
Como o tempo era de Natal, falámos bastante no presépio e no significado do Natal. Havia umas folhas com um presépio desenhado que os miudos pintaram. Depois as missionárias quiseram fazer um presépio com cabaninha e tudo, mas como não tínhamos nada ali, resolvemos ir inventar. Fez-se uma cabaninho de paus e capim (erva) e as figuras?! Não havia figuras, então propus aos miudos inventarem figuras, nem que fosse de capim, de papel, ou outra coisa. Encontrei um bocado de papelão velho no chão, recortei-o e fiz as três figuras do presépio. Fiz-lhes as caras com uma caneta, e eles acharam piada. Entretanto dispersaram, e eu pensei que eles já não estavam a ligar nenhuma ao assunto, quando dali por um bocado, apareceu um miudo com um conjunto de figuras muito giro, feito de canas fininhas verdes, com o pormenor dos olhos e tudo! Achei espectacular!! Depois a Catarina quis fazer as figuras em capim e lá fizemos o presépio típico do sítio onde nos encontrávamos. Os miudos também foram com a Sónia ao rio, onde havia algum barro e muitos moldaram figuras em cima de pedras grandes que serviam de base. Pusemos tudo em exposição na Igreja(?) onde foi celebrada a missa do galo e a missa de Natal. Outra coisa que me surpreendeu, foi o povo daquele local ter decidido representar uma peça de teatro sobre o Natal. Foi muito engraçada a maneira como se caracterizaram apenas com paus, panos, um chapéu largo e umas barbas de milho a fazer de barba.
Os missionários tinham o Sr. Filipe, um senhor negro, já de idade, que cozinhava e fazia pão para a equipa! Na véspera de Natal a Vera aproveitou o forno e fez um Bolo-Rei com as poucas coisas que tinham trazido da cidade. Não ficou nada de jeito, mas como estava doce, comeu-se e mesmo duro, como foi ficando. Fizemos um centro de Natal muito original, com ervas, capim, umas florinhas brancas e vermelhas que lá havia, que murcharam logo, mas que deu para nos fazer lembrar do Natal supérfluo que temos nas nossas terras e nas nossas casas.
E foi assim o meu Natal de 2006. Outras lembranças mais pormenorizadas e as vivências, ficam comigo para sempre. Um Natal muito diferente do habitual em vários aspectos, mas muito vivido e muito sentido!! Gostei sinceramente. E porque a minha memória tende a deteriorar-se com o passar do tempo, deixo estas pequenas notas escritas, para me fazerem recordar todo o encanto daquela semana.

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

A experiência do meu Natal 2006....

A experiência do meu Natal de 2006 passado em Angola a acompanhar o Grupo
Missionário ONDJOYETU numa semana de missão no Gungo.

O Gungo é uma zona do interior de Angola, um pouco a sul do Sumbe (Kuanza Sul) rodeada de montanhas, mato e lavras com árvores de fruta (principalmente banana) e milho. O povo vive em pequenas aldeias ou comunas distantes umas das outras, ligadas entre si por uma picada estreita feita de pedras, buracos e lama com um acesso apenas possível a Jipes, motas e camiões IFA, ou a pé, que é como normalmente o povo se desloca. E foi precisamente neste fim do mundo de 50 Km de picada praticamente intransitável, que demorou 12 horas a percorrer, que eu e a equipa missionária Ondjoyetu (constituída pela Sónia, a Vera, a Catarina, o Pe. Víctor e o Pe. David) vivemos o nosso Natal de 2006.
Porque foi uma experiência única na minha vida que quero relembrar por mais vezes, vou tentar descrever a memória desses 5 dias.
O calor era sufocante e o Jipe do grupo sem ar condicionado, portanto janelas abertas para entrar vento (quente!) o que proporcionava também a entrada de mosquitos, aranhos ou outros insectos pequenos. Avisaram-me com antecedência que a viagem e a estadia por terras da Donga ia ser difícil e ter muitas privações, mas eu estava decidida a arriscar e além do mais ia estar com a minha filha que não via há uns meses.
Não posso por mais que queira e tente, descrever ao pormenor o que foram essas 12 horas de saltos, de Jipe quase virado, de cerca de 20 ou mais paragens com o Jipe encalhado ou enterrado, com alguns bons metros a andar a pé na picada, saltando por cima da lama, dos montes de formigas “Kissonda” ou outros bicharocos, e sem luz (apenas um foxe) quando caiu a noite e apenas nos guiava a luz do Jipe e a da Lua no céu. Vi uma séria de estrelas cadentes e um céu estrelado bem bonito no meio daquela escuridão!! Hoje, algum tempo depois, dou Graças a Deus por me ter permitido ver e viver esses momentos únicos sem nunca ter tido medo nem nos ter acontecido nada. Segundo soube depois, o local é muito povoado de cobras, sardões, macacos e em alguns locais ainda se encontram avisos de “Perigo de minas explosivas”!
Na Donga (que vai ser o centro da missão Ondjoyetu) e que fica no cimo de uma montanha rodeada de imensas montanhas verdejantes mais pequenas, existem 3 construções semi-desfeitas, deixadas do tempo colonial. Uma construção rectangular com 4 divisões, duas das quais funcionaram como quartos para dormirmos, uma pequena varanda estreita a toda a volta, partida em alguns sítios, com portas e janelas (que já foram colocadas pelos missionários, assim como o telhado em chapa) mas por onde entra à vontade não só o vento, como sapos, ratos, sardões, etc… Outra construção só com paredes, telhado e buracos nas portas e janelas, onde funciona a Igreja. E a outra construção, mais pequena, com duas divisões, uma onde funciona a cozinha e dispensa e a sala para as refeições com uma mesa e cadeiras.
As janelas desta divisão são de panos do Congo, dos que as mulheres usam em Angola, por acaso muito bonitos com o desenho de Nª Srª de Fátima, e presos com galhos de árvores, para não estarem sempre a voar. O quarto das meninas tem 2 beliches de ferro, daqueles das casernas da tropa com uma tábua em cada. Dormimos as 4 no mesmo quarto, eu e a Vera, a Sónia e a Catarina. Por cima da tábua colocamos uma esponja fininha a fazer de colchão. Ao lado do quarto existe um compartimento com pretensões a W.C. mas onde existe apenas um buraquito no chão. Fazemos aí o xixi durante a noite, e depois colocamos água em cima. Também nos lavamos e tomamos banho de balde nesta divisão, mas durante o dia temos que usar a “Latrina”. A “Latrina” foi uma surpresa degradante para mim. Quando vi aquele quadradito feito de canas e revestido de folhas de palmeira e outros arbustos, com um buraco no centro, para fazer as necessidades, separado do sítio onde dormíamos uns 500 Mts, no meio de mato, onde apenas foi aberto um caminhozito para passarmos, disse logo bem alto:”Eu…. ir ali!! nem pensar!!...” Mas isto foi só um arrufo de primeira impressão porque depois, que remédio tive eu!!... Não havia outro sítio, e não ia ficar de rabo ao ar em frente de toda a gente que por ali circulava. Para afastar o medo dos bicharocos, cada vez que ia à Latrina, dirigia-me para lá a cantar, abanava com uma cana a bater nos arbustos as paredes da Latrina e depois de ter ouvido os bicharocos, como pequenas sardaniscas a abandonar o local é que entrava e sempre a olhar à minha volta. Que medo que eu passei, que falta de higiene, que falta de tudo o que nos habituámos a possuir nas nossas casinhas. Nem dá para contar tudo ao pormenor, porque só entende bem, quem passa pela situação. O lavar a loiça, o acartar água, o poupar a água para tudo, enfim!!!..... As milhentas de coisas que nos põem a pensar: “Meu Deus, como somos preveligiados!!” E apesar de tudo isso…. Porque passamos a vida a queixar-nos?? Porque estamos tantas vezes tristes e chateados com coisas que são insignificantes perante a realidade deste povo?!...
Depois há o contacto com aquele povo do interior, um povo sofrido, habituado a fugir da guerra, a andar de um lado para o outro no meio do mato, e a ver morrer os seus familiares com doenças por não terem nem medicamentos, nem enfermeiros. E é nessa gente sofrida que nada tem, que encontro precisamente a vontade de dar, de partilhar e de ser útil aos outros. Para eles os missionários, nos quais eu estava incluida, seja por serem de outra cor, ou por saberem mais, serem mais inteligentes ou terem um modo de vida mais evoluido, são as pessoas a quem dedicam toda a atenção. Ouvem-nos com extrema atenção, embora a maior parte das vezes nem entendam bem o que dizemos. Fixam o olhar em todos os nossos gestos, fazem tudo por nós e para nós. Levam ou transportam as nossas cadeiras de um lado para o outro onde sejam precisas, fazem-nos as refeições, as mulheres deslocam-se ao rio descendo e subindo um monte, para nos trazerem água em bacias enormes que transportam à cabeça e às vezes com os filhos às costas. Doi-nos o coração ao ver tudo isto, mas não adianta reclamar. Eles sentem-se muito importantes com tudo o que fazem para nós.
E a importância que eles dão a pequenas coisas, daquelas que para nós chamamos lixo?? Lembro-me de em casa das missionárias se lavarem as latas de conservas vazias e guardarem num saco grande para levarem para os miudos do Gungo. São o seu brinquedo predilecto. Lembro-me ainda de ir pôr um saco com o nosso papel higiénico sujo num buraco que havia sido feito para o lixo e uma das meninas me dizer para ir pôr fogo ao saco, senão alguém iria despejar o saco e aproveitá-lo.
Mais uma dor de coração!! Um simples saco de plástico!! E nós com tantos em Portugal e mesmo em Luanda, que voam por todo o lado! É incrivel o valor que as mais pequenas coisas que nós nem ligamos, são de um valor inestimável para quem nada tem!! A minha vontade era dar-lhes tudo o que tinha trazido para ali(pois ainda ficaria com muito na cidade!) mas as missionárias tiraram-me o entusiasmo, dizendo que não ia adiantar muito porque as coisas não iam dar para todos( que eram muitos) e ia criar desavenças e invejas entre eles, pois todos iam querer qualquer coisa. Por exemplo, se eu desse algo a um miudo, os outros iriam todos correr atrás dele até lhe tirarem ou puxariam tanto para um e outro lado que acabavam por estragar e ninguém usufruiria. À sucapa mandei entrar para o nosso quarto uma das meninas (de 5 ou 6 anitos) que me pareceu das mais pobrezinhas pois tinha uma blusita toda esfarrapada e com enormes buracos. Abri a minha mala e procurei uma das minhas T-Shirts mais pequenas e vesti-lha. Era uma do Verão Foz - cor de laranja – que ficou muito bem à minha Teresa (como eu lhe passei a chamar), e que assim passou o dia de Natal toda bonitinha. Era muito meiga e envergonhada esta miuda e tinha um sorriso muito bonito. Durante a missa, dirigiu-me diversas vezes o seu olhar envergonhado, acompanhado de um sorriso cúmplice. Uma outra vez que fui ao Sumbe ter com a Vera e as outras missionárias, fomos a uma feira e resolvi comprar uma saia para a minha Teresa. Disse-me a Vera que ela gostou e eu comprovei em várias fotos tiradas posteriormente nas celebrações dos missionários, em que sempre a menina estava vestida com a simples roupa que eu lhe dei. Gostava de poder fazer isto a muitos mais, mas eles são tantos, que é impossível.